Jesus amigo de prostitutas,
publicanos, órfãos, viúvas, estrangeiros (samaritana), doentes (leprosos),
loucos e escravos – amigo dos marginalizados.
(Dom 11. Ciclo c. Lc 7, 36-8,3). Neste Domingo, Lucas
continua a colocar-nos perante o relacionamento de Jesus (Igreja) com as pessoas
marginalizadas (neste caso, prostitutas), como nos domingos anteriores o fez com
os órfãos, viúvas e estrangeiros.
Trata-se de um tema "complexo", que que se liga
com opressão e sexo, moral intimista e moral social ("pecado" pessoal,
pecado de dinheiro), mundo e Igreja (podendo-se passar facilmente da
prostituição à pornografia infantil, à pederastia e aos lobbies de cariz sexual).
É, além de mais, uma questão de organização ou de ministérios
eclesiais; tanto se pode passar do assunto sobre as mulheres
"sacerdotes", como assumir a "prostituta recuperada" pelo
amor (cf. Lc 7,36-50), às mulheres que "servem" a Jesus e ao
evangelho – as primeiras "apóstolas" de Jesus.
Este assunto prossegue uma questão fundamental da vida da
Igreja e de toda a humanidade, tema de mulheres e homens, tema de poder e de afecto,
de opressão e liberdade. A mensagem de Jesus continua a ser forte.
A prostituição tem
tido ao longo da história várias funções entre as quais se podem recordar as do
tipo religioso: nos grandes santuários das deusas, da Palestina e da
Babilónia até à Índia, costumava haver mulheres e homens: prostitutos sagrados
(hierodules), que agiam como um sinal da divindade, iniciadores sexuais dos
homens (e mulheres) na arte do amor (neste contexto pode-se falar de Ishtar e
Ísis, do casamento sagrado e do tantrismo). Mas, em geral, a prostituição
separou-se do culto e converteu-se numa forma de imposição e opressão
económica, sexual, afectiva.
Em quase todas as culturas edificadas sob os princípios patriarcais foi tolerada a prostituição
das mulheres como forma de regular a sexualidade dos homens e de manter seguras
as relações familiares (até meados do século XX era costume justificar a existência
dos bordéis como forma de garantir a harmonia da família). Em geral, a mulher
casada encontrava-se submetida ao marido e carecia de liberdade afectiva; por
isso:
– Nalguns casos, a
prostituta pode tornar-se como sinal de mulher libertada;
– Mas a imensa maioria das prostitutas acabam por se
tornarem meras escravas sexuais.
É destas últimas prostitutas que fala o Evangelho. Ela são
mulheres “violadas, dominadas, destruídas”. Numa sociedade patriarcal sempre
houve prostitutas; mas o seu número e a opressão sobre elas aumenta nos tempos
de crise económico-social e de ruptura familiar, como aquela porque passava a
Galileia no tempo de Jesus Cristo. Tinham-se multiplicado as mulheres que
estavam sós, sem terra e sem trabalho, sem família e sem possibilidades
laborais, sem qualquer outro “capital”
que não fosse o seu próprio corpo, num mundo onde só importava a ganância do
sistema. A situação social condenava-as à “prostituição”,
isto é, ao desenraizamento e à fome, à ignomínia social e à impureza.
É evidente que Jesus, profeta dos pobres e excluídos,
teve que se vincular a elas; de uma forma muito especial se relacionou com os
impuros e com os demais excluídos da sociedade, com os doentes e com os loucos,
com o submundo dos homens e das mulheres condenados pela mesma sociedade à
opressão laboral e sexual (que em muitos casos estavam unidas). A relação de
Jesus com as prostitutas (e com os publicanos) constitui um dos temas centrais
e mais enigmáticos do Evangelho, onde Jesus se compara a João Baptista. Os “justos”
de Israel (ou de qualquer sociedade estabelecida) condenam-no por andar com
gente de má vida. Jesus defende-se:
– “Os cobradores de impostos e as prostitutas vão
preceder-vos no Reino de Deus. João veio até vós, ensinando-vos o caminho da
justiça, e não acreditastes nele; mas os publicanos e as meretrizes acreditaram
nele. E vós, nem depois de verdes isto, vos arrependestes para acreditar nele”
(Mt 21,31-32).
Era um tempo e lugar de escravos (pessoas que tinham de
vender-se e faziam-no por motivos de trabalho e subsistência; era um tempo de
“pecadores” (pessoas que pareciam e eram impuras, desde as perspectivas de
pureza da elite sacerdotal e desde o novo legalismo dos judeus); era um tempo
de prostitutas (mulheres sem capacidade e sem possibilidades de um
desenvolvimento afectivo e familiar que respondesse às exigências morais e
religiosas daquele tempo).
Dizer que Jesus era amigo de publicanos e prostitutas é
dizer que era amigo de marginais sociais e morais, de homens e mulheres que não
têm nem podem desenvolver o seu próprio trabalho, de tal maneira que vivem por
um lado “oprimidos” e por outro prece que oprimem manipulando os outros (os
“bons” cidadãos) aparecendo, desta forma, como objectos da exploração e,
simultaneamente, do desprezo violento do conjunto da população.
Foi neste “vespeiro” humano que Jesus entrou, tornando-se
amigo de prostitutas e publicanos para iniciar com eles o caminho do Reino de
Deus – movimento integral, anti cultural, de transformação humana.
Não conheceremos Jesus se não o virmos no contexto e no
ambiente das “tabernas” e nos lugares onde se encontravam os “expulsos da
sociedade” e onde Jesus conheceu o publicanos e as prostitutas, os enfermos, os
loucos e os demais marginalizados, compartilhando com eles o escasso pão e
vinho que possuía, oferecendo-lhes o caminho e a esperança.
Jesus e a prostituta (Texto Lucas 7, 36-8, 3)
Um fariseu convidou-o
para comer consigo. Entrou em casa do fariseu, e pôs-se à mesa.
Ora certa mulher, conhecida naquela cidade como pecadora, ao saber que Ele
estava à mesa em casa do fariseu, trouxe um frasco de alabastro com perfume. Colocando-se por detrás dele e chorando, começou a banhar-lhe os
pés com lágrimas; enxugava-os com os cabelos e beijava-os, ungindo-os com
perfume.
Vendo isto, o fariseu
que o convidara disse para consigo: «Se este homem fosse profeta, saberia quem
é e de que espécie é a mulher que lhe está a tocar, porque é uma pecadora!»
Então, Jesus
disse-lhe: «Simão, tenho uma coisa para te dizer.» «Fala, Mestre» - respondeu
ele. «Um prestamista tinha dois devedores: um devia-lhe
quinhentos denários e o outro cinquenta. Não tendo eles com que
pagar, perdoou aos dois. Qual deles o amará mais?» Simão
respondeu: «Aquele a quem perdoou mais, creio eu.» Jesus disse-lhe: «Julgaste
bem.» E, voltando-se para a mulher, disse a Simão: «Vês esta
mulher? Entrei em tua casa e não me deste água para os pés; ela, porém,
banhou-me os pés com as suas lágrimas e enxugou-os com os seus cabelos. Não me deste um ósculo; mas ela, desde que entrou, não deixou de
beijar-me os pés. Não me ungiste a cabeça com óleo, e ela
ungiu-me os pés com perfume. Por isso, digo-te que lhe são
perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas àquele a quem pouco se
perdoa pouco ama.» Depois, disse à mulher: «Os teus pecados
estão perdoados.»
Começaram, então, os
convivas a dizer entre si: «Quem é este que até perdoa os pecados?» E
Jesus disse à mulher: «A tua fé te salvou. Vai em paz.»
Em seguida, Jesus ia de
cidade em cidade, de aldeia em aldeia, proclamando e anunciando a Boa-Nova do
Reino de Deus. Acompanhavam-no os Doze e algumas mulheres, que
tinham sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades: Maria, chamada
Madalena, da qual tinham saído sete demónios; Joana, mulher de
Cuza, administrador de Herodes; Susana e muitas outras, que os serviam com os
seus bens.
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